"Estou a vingar-me mais uma vez, a olhar esta  Geira Romana e os seus marcos delidos.
Estou a vingar-me de quantos Césares o mundo tem dado, convencidos de que basta mandar fazer calçadas e pontes, gravar numa coluna a era e o nome, para que a eternidade fique por conta deles.”

Miguel Torga, Diário IV

A Geira - Via Romana XVIII

Com  a conquista romana deste território rasgam-se sólidas vias que atravessam as monatanhas, riscam-se os primeiros cadastros, a exploração dos recursos mineiros intensifica-se e acentua-se a primeira uniformização politica da região sob o dominio imperial. Todo este território é, a partir do seculo I d.C. integrado na provincia romana da Calaecia, com capital em Bracara Augusta (actual Braga).É então que é contruida a estrada da Geira,  na serra da Gerês, um troço da via XVIII do Itenerário  de Antonino, ligado Bracara Augusta à Asturica Augusta (actual Astoga). Atravessa a serra do Gerês e penetra em espanha pela Portela do Homem. O percurso único, o mais monumental complexo arqueológico romano localizado no parque Nacional da Peneda - Gerês (PNPG), mantêm os seu 30Km quase intactos, com as suas pontes, muros, casas e dezenas de marcos milenários a assinalar as várias milhas (integradas no PNPG estão as milhas XXVII a XXXIV), muitos dos quais epigrafados com incrições datáveis entre o final do século I e o século IV d.C. que perpectuam a memória de governadores e imperadores.

A Via Romana nº 18 do Itinerarivm Antonini ( um roteiro do séc. IV que chegou até nós), popularmente conhecida por “ Geira” é uma das estradas militares construída presumivelmente no ultimo terço do séc. I d.C.,  ligando Bracara Avgvsta a Astvrica Avgvsta ( actual Astorga). Num percurso de 215 Milhas.

A justificação da sua construção encontra-se talvez na necessidade de que as legiões sentiram de poderem penetrar mais rapidamente nas montanhas desta região.

 

Como seu traçado extremamente bem estruturado por permitir galgar vários tramos de montanha sem subidas ou descidas muito acentuadas, encurtou-se também a ligação entre aquelas duas cidades, até ali só possível pela via  de Aquae Flavaie ( actual Chaves).

As características da estrada romana da “Geira”, aliando uma construção solida a um traçado harmonioso, e o facto de ser durante séculos a melhor e talvez única via que atravessava a Serra do Gerês, tornando-se uma rota quase mítica para os povos da região, que a foram restaurando e utilizaram praticamente até ao nosso século.

Saindo de Bracara Avgvsta e ligando os actuais concelhos de Amares e Terras de Bouro, a “Geira” atravessa o que é hoje o território do

PNPG. Marginando o rio Homem entre as zonas de S. João do Campo e a Fronteira da Portela do Homem, ai se internando por terras da actual Galiza.

 No seu percurso, ainda hoje se assinala o traçado entre as milhas XXVII e XXXIV, na sua maioria evidenciadas por grupos de Milíarios, muitos dos quais epigrafados e cuja densidade por milha é um facto sem paralelo no mundo romano. Outros vestígios arqueológicos neste traçado, como os restos de estruturas de pontes, uma Mutatio ( estação de muda) junto da milha XXX e a presença de um possível templo na Veiga de S. João do Campo junto á milha XXVII, fazem deste conjunto um dos mais notáveis e monumentais complexos arqueológicos ligados á conquista romana do nosso noroeste, ainda para mais integrado no interior de uma  das mais importantes Reservas Nacionais do PNPG, como é a Mata da Albergaria.

Acerca dela, escreveu em 1728 o Pe. J. Matos Ferreira:

"Destes caminhos que de Braga sahiam, o mais magestoso e admirável he o da Geyra, que toma a parte Norte pela aspereza das terras que passa, bosques e terras que corta e imminencia que segue, maravilha rara, e obra muyto sumptuosa e estupenda para os passageiros que a seguem, porque nela achão todo o genero de delicias que podem apetecer."

No tempo em que o caloroso estio tudo abrasa com seus ardentes rayos, na Geyra se acha a aura fresca que Aquilo e Zefiro lhe comunicão, e pellas grandes terras que por ella se vão descubrindo, achão tambem a mais deleitavel vista e emprego dos olhos.Quando o procelloso Inverno tudo allaga com suas enchentes e inundações, nella tem os viandantes os portos mais seguros e caminho livre dellas; porque he estrada que vay sempre por terras altas, e não recebe em si ajuntamentos de agoas.

 
He caminho de grande recreação para a vista, e muyto suave e facil para passageiros e de grande descanso para as cavalgaduras e toda a casta de animais. Em todo elle se não acha nada de sobida ou decida; porque nas partes, a donde as havia de haver, faz hum gyro ou volta com que sempre he caminho cham e plano.

(...) He tambem cousa magestosa os muytos padrões ou colunas que nella se veem (Marcos Miliários), sendo pedras de extrema grandeza, postas todas em demarcação das milhas; porque adonde fazião milha he que as punhão, servindo-lhe de marcos com os quais demarcavão as milhas que começavão a contar da cidade de Braga (...), e nas ditas colunas escrevião os titulos e façanhas de seus Emperadores; para que se eternizassem, escritas naquellas colunas ou padrões postos na estrada militar da Geyra, que, como hera a mais publica e frequentada, assim fossem os seus nomes e proezas."

A Via Romana da Geira, também consta da rota dos Caminhos de Santiago em Portugal, por na Idade Média ter começado a ser percorrida pelos peregrinos ostentando a simbólica vieira.

  



Mapa da Geira

 

 

Outras Marcas Culturais:

Silha

Era uma estrutura que protegia os cortiços do apetite por mel do urso-pardo Ursus arctos que vagueou por estas terras até meados do século XVII.
As silhas eram construídas com blocos de granito (abundante na região), em parede dupla, com muros ligeiramente inclinados para fora, sendo a fiada superior ligeiramente saída e com altura sempre superior a 2,8 m. No seu interior, dispostos em pequenos socalcos e travados por pedras, eram colocados os cortiços, de forma circular e feitos de cortiça (daí o nome) e cobertos com um telhado de colmo. Algumas das silhas tinham pequenas portas que davam acesso ao interior.
As silhas, de forma a favorecer o trabalho e a saúde das abelhas, eram sempre construídas em encostas ensolaradas e abrigadas do vento, voltadas a nascente/sul. Eram construídas perto da água e de vastas extensões de matos formados por plantas melíferas, compostos por urzes (Erica spp.), carqueja (Pterospartum tridentatum ssp. tridentatum), tojo (Ulex spp) e giestas (Cytisus spp.).

Fojo do lobo

Trata-se de uma armadilha usada no passado pelas populações para atrair e matar este mamífero. O lobo-ibérico Canis lupus signatus tem neste Parque Nacional um dos seus últimos refúgios. Trata-se de uma espécie com o estatuto de proteção de "em perigo" de extinção. Segundo ALVARES, et al (2000), os fojos, na maioria dos casos construídos em pedra, serão, talvez, o símbolo máximo das manifestações culturais a nível ibérico da relação, tantas vezes fatal para o lobo, entre as populações humanas e aquele predador. "São estruturas cuja construção envolveu um enorme esforço e grande número de pessoas, sendo, também, verdadeiros monumentos de elevado valor etnográfico, cultural e científico."
A nível mundial, o norte da Península Ibérica parece ser a região onde existem fojos em maior número e variedade". "De acordo com a sua tipologia e modo de utilização existem 5 tipos distintos de fojos: o Fojo simples; o Fojo de Cabrita; o Fojo de paredes convergentes; o Fojo de alçapão; e o “Corral”. À exceção do fojo simples, com distribuição generalizada, as restantes estruturas distribuem-se maioritariamente nas serras agrestes do nor-noroeste Ibérico, estando, aparentemente, ausentes nas zonas baixas e planálticas mais humanizadas". (in Os Fojos dos Lobos na Península Ibérica. Sua Inventariação, Caracterização e Conservação).

Brandas e inverneiras

As brandas podem ser brandas de cultivo ou brandas de gado e localizam-se no planalto ou em chãs de altitude. São núcleos habitacionais temporários cujos terrenos são usados para a agricultura ou alimentação do gado, durante a primavera/ verão, quando essas áreas de montanha apresentam condições mais favoráveis a essas atividades. Em contraposição às brandas surgem as inverneiras - núcleos habitacionais onde as populações passam o outono e inverno (daí o nome). Presentemente, nessa transumância imposta pelas condições agrestes do meio, nas aldeias que ainda mantém essa migração, as populações apenas transportam consigo o gado e alguns haveres.

Referencias: municipio de Terras de Bouro e website panoramico e icnf




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